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Entre as nossas caixas e as nossas tralhas

  • Foto do escritor: pietramanzoli
    pietramanzoli
  • 6 de mar. de 2023
  • 2 min de leitura

Gosto de pensar que o mundo interno do ser humano se parece muito com uma casa. Às vezes é abarrotada de tranqueiras, outras não. Algumas são coloridas, outras são mais sóbrias. Na maior parte delas, surge um cômodo ou outro mais esquisito - ou mais original, depende do senso estético de cada um. Um cuidadosamente decorado - geralmente aquele onde recebemos as visitas - e outros empoeirados. Da forma como for, cada um de nós tem sua própria planta arquitetônica da mente: única, singular e especial.


E, assim como nos nossos lares, dentro do nosso espaço mental costumamos ter uma - ou várias - gavetas da bagunça. É lá que guardamos tudo que não sabemos onde mais colocar. Aquilo que outras pessoas nos deram e, mesmo que não tenha sido adquirido por nossa escolha, não conseguimos jogar fora. Aquilo que, apesar de muito antigo, sentimos que ainda poderemos precisar algum dia.


Ocasionalmente revisitamos estas gavetas e, olhando para o pequeno tesouro esquecido que acumulamos durante os anos, pensamos se algo ainda pode nos ser útil. Em alguns momentos a resposta é sim. Já em outros, decidimos que aquele cacareco específico, por mais bonito ou aparentemente funcional que seja, passou a ocupar espaço demais dentro de nós.


Também guardamos nessas gavetas objetos que jamais passam por essa inspeção cuidadosa de limpeza e reorganização. É como se fossem caixas muito bem trancadas, protegendo dentro de si algo misterioso. Não sabemos se é um tesouro, uma jóia ou uma pequena bomba. Por garantia os mantemos ali, e por vezes nos esquecemos completamente deles. Os colocamos no fundinho do móvel, longe dos olhos e da nossa própria curiosidade. Vez ou outra, entretanto, tentamos fechar a gaveta e percebemos que alguma coisa tranca nosso movimento. Buscamos as caixinhas esquecidas e voltamos a nos perguntar o que será que existe ali dentro. Geralmente acabamos guardando novamente na gaveta. Entretanto, em raros momentos de coragem, ousamos abri-las.


Com dor e surpresa, costumamos encontrar lá dentro pequenos pedaços recortados de nossa trajetória: um sonho bonito, uma história de família, ou um desejo que tentamos a todo custo deixar de desejar. Por um momento, lembramos do que no fundo sempre soubemos: esquecer é muito trabalhoso. Muito mesmo. Quem sabe até impossível.


Imagem: Louise Nevelson, Big Black, 1963


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